segunda-feira, 23 de junho de 2008

Viajei em um ônibus fantasma



Gerson Tavares



Sábado, 21 de junho de 2008, faltam 15 minutos para as 4 horas da tarde. Embarco em um ônibus da empresa Evanil com destino a Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense, na Central do Brasil. Quero ter certeza se realmente é verdade aquilo que de falaram.


Já passei dos 65 anos, ocupo o primeiro assento, logo atrás da porta dianteira, a porta de embarque. Logo ao entrar já notei que o motorista também é o cobrador de um carro que só sentados, irão viajar 45 passageiros. E assim começa a grande viagem do “ônibus fantasma” com destino ao desconhecido.
Saímos do ponto inicial na Central do Brasil já com atraso em virtude das dificuldades do motorista em organizar a cobrança e ainda liberar a roleta para os passageiros passarem. Como a roleta fica um pouco distante do motorista, o pobre coitado libera a trapizonga apertando um botão no painel do carro. Bem, até chegar a Rodoviária Novo Rio, fora o nervosismo do motorista que buzinava freneticamente para que os outros motoristas saíssem de sua frente com tudo o mais correu dentro daquilo que até pode-se chamar de quase normalidade.


Mas depois da Rodoviária, quando o ônibus alcançou a Avenida Brasil, senti que muitas emoções estavam por vir. Em cada “baia” (aqueles recuos para parada de ônibus) existe espaço para no máximo três ônibus. Não é que mais de 10 ônibus disputavam espaço para pegarem seus passageiros e ainda disputam cada passageiro com umas 15 vans? Logo no primeiro ponto, cuja parada fica em um lugar bem propício, ao lado do cemitério do Caju, o motorista mostrou que não ia ser moleza a viagem. Ele levou uma fechada de um outro ônibus, descontou em mais dois que também queriam um espaço na “baia”, pegou os passageiros pela porta da frente e pela porta traseira pegou um camelô que já jogou, lá do meio do carro, um pacote de amendoim sobre o capô do motor lá na frente e aos berros pedia desculpas aos “ilustríssimos passageiros” por tirar a tranquidade (que tranquilidade?) da viagem e imediatante começou a vender o seu produto. Enquanto isso, o motorista sai da “baia” fazendo o troco, apertando o botão que libera a roleta, olhando para trás pelo retrovisor e também olhando para ver se está tudo bem lá na roleta, passa a marcha no ônibus enquanto ainda olha pra frente para não bater na traseira do outro ônibus que ainda teima em pegar mais passageiros. Força no acelerador para chegar ao próximo ponto na frente dos “adversários” e segue a viagem com uma fechada aqui, uma freada ali, e nessa desenfreada guerra de fumaça, um caminhão que está mais lento a sua frente, leva uma fechada mais violenta com uma guinada de dar inveja a qualquer piloto de formula um, pois logo ali na frente tem mais uma “baia” que o nosso “piloto maluco” precisa chegar forte para pegar mais alguns “corajosos” que precisam chegar às suas casas. Depois de cada parada, mais uma arrancada com a mesma rotina de olha pelo retrovisor, olha para frente, olha a roleta, faz troco, acelera e segue dando guinadas e freadas para mais uma vez acelerar com os passageiros seguindo viagem naquela “roleta russa” que não acaba nunca.


Os passageiros que vêem esta ação insana do “piloto de provas” tomam susto a cada freada, a cada arrancada, a cada guinada do ônibus. E de “baia” em “baia” da Avenida Brasil, ele chega à Rodovia Presidente Dutra. Ali ele já está colado na traseira de um outro ônibus da própria empresa, mas as disputas por passageiro continuam. Depois de algumas disputas, depois de mais umas paradas nos pontos da marginal da Dutra, pegando passageiro, um aqui, outro ali e mais alguns quilometros chegamos ao final da viagem com todos salvos. Muito assustados, mas salvos.


Mas agora eu pergunto: quem é o culpado por essa loucura toda? O motorista ou o ganancioso empresário que para pedir aumento de passagem, coloca na planilha que os veiculos têm motorista e trocador? Ou ainda o presidente do Detro, que é o órgão que fiscaliza? Os fiscais do Detro? O secretário de Transportes do estado? Mas no caso da Evanil, também cabe grande parte da culpa ao Dnit, já que os seus ônibus transitam por rodovia federal. E por que não, o ministro dos Transportes? Afinal, qualquer pessoa pode ver que ninguém tem condição de acumular as duas funções, motorista e cobrador, em um ônibus daquele tamanho, que muitas vezes chega a carregar mais de 70 passageiros. Alguém, que pense um pouquinho vai ver que um crime está sendo cometido.

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